domingo, 31 de maio de 2009

Cantando sobre os ossos...

"A fauna silvestre e a mulher selvagem são espécies em risco de extinção."
Observamos, ao longo dos séculos, a pilhagem, a redução de espaço e o esmagamento da natureza instintiva feminina. Durante longos períodos ela foi mal gerida, à semelhança da fauna silvestre e das florestas virgens. Há alguns milênios,sempre que lhe viramos as costas, ela é relegada às regiões mais pobres da psique. As terras espirituais da Mulher Selvagem, durante o curso da história, foram saqueadas ou queimadas, com seus refúgios destruídos e seus ciclos naturais transformados à força em ritmos artificiais para agradar os outros.

Não é por acaso que as regiões agrestes e ainda intocadas do nosso planeta desaparecem à medida que fenece a compreensão da nossa própria natureza selvagem mais íntima. Não é tão difícil compreender porque as velhas florestas e as mulheres velhas não são consideradas reservas de grande importância. Não há tanto mistério nisso. Não é coincidência que os lobos e os coiotes, os ursos e as mulheres rebeldes tenham reputações semelhantes.

Todos eles compartilham arquétipos institivos que se relacionam entre si, por isso, têm reputação equivocada de serem cruéis, inatamente perigosos, além de vorazes. Minha vida e meu trabalho como analista junguiana e cantadora, contadora de histórias, me ensinaram que a vitalidade esvaída das mulheres pode ser restaurada por meio de extensas excavações "psiquico-arqueológicas", e, através de sua incorporação ao arquétipo da Mulher Selvagem, conseguimos discernir os recursos da natureza mais profunda da mulher. A mulher moderna é um borrão de atividade. Ela sofre pressões no sentido de ser tudo para todos. A velha sabedoria há muito não se manifesta.

O título do livro, Mulheres que correm com os lobos, mitos e histórias do arquétipo da Mulher Selvagem, foi inspirado nos meus estudos sobre a biologia de animais selvagens, em especial os lobos.
Os estudos de lobos Canis Lupus e Canis rufus são como a história das mulheres, no que diz respeito à sua vivacidade e à sua labuta.

Os lobos saudáveis e as mulheres saudáveis têm certas características psíquicas em comum: percepção aguçada, espírito brincalhão e uma elevada capacidade para a devoção.
Os lobos e as mulheres são gregários por natureza, curiosos, dotados de grande resistência e força. São profundamente intuitivos e têm grande preocupação para com seus filhotes, seu parceiro e sua matilha.
Têm experiência em se adaptar a circunstâncias em constante mutação. Têm uma determinação feroz e uma extrema coragem.


No entanto as duas espécies foram perseguidas e acossadas, sendo-lhes falsamente atribuído o fato de serem trapaceiros e vorazes, excessivamente agressivos e de terem menor valor que os seus detratores. Foram alvo daqueles que preferiam arrasar as matas virgens bem como os arredores selvagens da psique, erradicando o que fosse instintivo, sem deixar que dele restasse nenhum sinal.

A atividade predatória contra os lobos e contra as mulheres por parte daqueles que não os compreendem é de uma semelhança surpreendente. Foi por aí que o conceito do arquétipo da mulher Selvagem primeiro se concretizou para mim: no estudo dos lobos.

Estudei também outras criaturas como, por exemplo, os ursos, os elefantes e os pássaros da alma, as borboletas.

As características de cada espécie fornecem indicações abundantes do que pode ser conhecido sobre psique instintiva da mulher.(...) Chamo-a Mulher Selvagem porque essas exactas palavras, mulher e selvagem, criam llamar o tocar a la puerta, a batida dos contos de fadas à porta da psique profunda da mulher. Llamar o tocar a la puerta significa literalmente tocar o instrumento do nome para abrir uma porta. Significa usar palavras para obter a abertura de uma passagem. Não importa a cultura pela qual a mulher seja influenciada, ela compreende as palavras selvagem e mulher intuitivamente.(...) Quando as mulheres reafirmam seu relacionamento com a natureza selvagem, elas recebem o dom de dispor de uma observadora interna permanente, uma sábia, uma visionária, um oráculo, uma inspiradora, uma instintiva, uma criadora, uma inventora e uma ouvinte que guia, sugere e estimula uma vida vibrante nos mundos exterior e interior.

Quando as mulheres estão com a Mulher Selvagem, a realidade desse relacionamento transparece nelas. Não importa o que aconteça, essa instrutora, mãe e mentora vagem dá sustentação às suas vidas interior e exterior. Portanto, o termo selvagem neste contexto não é usado em seu actual sentido pejorativo de algo fora de controle, mas em seu sentido original, de viver uma vide natural, uma vide em que a criatura tenha uma integridade inata e limites saudáveis. Essas palavras, mulher e selvagem, fazem com que as mulheres se lembrem de quem são e do que representam. Criam -lhe uma imagem para descrever a força que sustenta todas as fêmeas.

Elas encarnam uma força sem a qual as mulheres não podem viver. O arquétipo da mulher selvagem pode ser expresso em outros termos igualmente apropriados. Pode-se chamar essa poderosa natureza psicológica de natureza instintiva, mas a Mulher Selvagem é a força que está por trás dela.(...mesmo a mulher presa com a máxima segurança reserva um lugar para o seu self selvagem, pois ela intuitivamente sabe que um dia haverá uma saída, uma oportunidade, e ela poderá escapar.).

(...) A mulher selvagem carrega consigo os elementos para a cura; traz tudo o que a mulher precisa ser e saber. Ela carrega histórias e sonhos, palavras e canções, signos e símbolos. Ela é tanto o veículo quanto o destino. Aproximar-se da natureza instintiva não significa desestruturar-se, mudar tudo da esquerda para a direita, do preto para o branco, passar do oeste para o leste, agir como louca ou descontrolada. Não significa perder as socializações básicas ou tornar-se menos humana. Significa exatamente o oposto. A natureza selvagem possui uma vasta integridade.

Ela implica delimitar territórios, encontrar nossa matilha, ocupar nosso corpo com segurança e orgulho independente dos dons e das limitações desse corpo, falar e agir em defesa própria. Estar consciente, alerta, recorrer aos poderes da intuição e do pressentimento inato às mulheres, adequar-se aos próprios ciclos, descobrir aquilo a que pertencemos, despertar com dignidade e manter o máximo de consciência possível.

(...) E então, o que é a Mulher Selvagem? Do ponto de vista da psicologia arquetípica, bem como da tradição das contadoras de histórias, ela é a alma feminina. No entanto, ela é mais do que isso. Ela é a origem do feminino. Ela é tudo o que for instintivo, tanto do mundo visível quanto do oculto, ela é a base. Cada um de nós recebe uma célula refulgente que contém todos os instintos e conhecimentos necessários para nossa vida.

" Clarissa Pinkola Estés, "Mulheres que correm com os lobos."

5 comentários:

Ana Karina Fainascki Panzoni disse...

olá!!!
Saudades!!! Estava ausente, mas retornei. vim te visitar e agradecer pelo carinho e atenção
de sempre. estou te entregando o prêmio da amizade, passa no
meu blogger. é de coração!!!

te Adoro muito!!!!

Beijinhos,
Karina.

Christiane disse...

Babi

Amei o texto e conheço o livro.

Na atual conjutura do que vivo só ressussitando o que há de selvagem em nós para viver!

Estou plugada por aqui também! E no Universo Eco feminino... Na verdade estou com planos de fundar uma nova filosofia e lugar... Pensando ainda e desatando algumas amarras...

Beijo!

Chris

Luciana Onofre disse...

amore um selo ecológico para ti lá no germinando :D

Anônimo disse...

Olá,

Novo conto no Lobas Que Correm: La Mariposa, a Mulher-borboleta.

http://lobasquecorrem.blogspot.com/

Espero que goste!
Beijos.

Márcia disse...

Olá.Adorei seu blog, muito lindo!