quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Absorvente ecológico - Parte 1

Incomodada ficava a sua avó
Hoje relegada ao banheiro, a menstruação já ocupou um lugar de destaque na vida das comunidades matriarcais. Agora, as mulheres estão redescobrindo o poder inerente a esse ciclo cósmico-feminino. Adotar absorventes reutilizáveis, em vez dos poluidores descartáveis, é um dos passos nesse processo.

Uma pergunta para as mulheres: como você encara a sua menstruação? Como algo que incomoda, que vem de surpresa e a pega desprevenida, manchando calcinhas e causando cólicas? Como um inconveniente que você, se pudesse, não teria? Ou como apenas mais um dos fatos da vida, sobre os quais não temos nenhuma influência e dos quais queremos nos livrar o mais rápido possível?
Se alguma dessas descrições se encaixa na sua visão sobre a menstruação, você provavelmente prefere tampões e mal olha para baixo quando está trocando o absorvente. Quanto menos você ver, ou tiver que lidar com o seu sangue menstrual, melhor. A idéia de um absorvente reutilizável, que você lava em vez de jogar fora, é totalmente alienígena.
Afinal, "incomodada ficava a sua avó" - como dizia o anúncio. As mulheres modernas têm uma infinidade de opções de absorventes e tampões descartáveis. Você compra, usa e joga fora, e isso certamente é um progresso incrível. Fora que mulheres modernas não têm tempo para lavar absorventes. Para que, depois de conquistado o direito ao absorvente descartável, voltar ao tempo da sua avó, que tinha que lavar as embaraçosas toalhinhas higiênicas feitas de flanela?
O raciocínio acompanha os tempos atuais - nos quais, pela praticidade e economia de tempo, se sacrificam recursos naturais e a real qualidade de vida: levar uma vida consciente, em harmonia com o planeta. Os produtos descartáveis são vistos como um progresso e sinônimo de modernidade, porque evitam que se "gaste" nosso precioso e escasso tempo. Muitas mulheres, no entanto, estão preferindo voltar ao tempo da avó, abandonando o destrutivo progresso moderno por uma vida sustentável. E isso tudo pode começar bem perto de nós, no nosso lugar mais íntimo...

Poluição, recursos naturais e autonomia

Estamos pagando um preço muito alto pela praticidade moderna. A produção de descartáveis abusa de recursos naturais que mais cedo ou mais tarde se esgotarão. Absorventes são feitos de papel - leia-se árvores - ou algodão. As árvores, ou o algodão, passam por inúmeros processos de refinamento e branqueamento e acabam grudado na sua calcinha - de onde vão direto para o lixo. Imagine quantas mulheres em idade fértil vivem no planeta. Agora pense em quantos absorventes cada uma dessas mulheres usará durante sua vida fértil. Segundo Diana Hirsch, fabricante dos absorventes reutilizáveis aBiosorventes, "cada mulher usa em torno de 10 mil absorventes descartáveis durante sua vida fértil". Apenas nos Estados Unidos são jogados fora 12 bilhões de absorventes e 7 bilhões de tampões por ano.
Agora imagine para onde vai esse lixo, que não é biodegradável... Imaginou? Não, não existe um limbo dos absorventes. Eles não se desmaterializam assim que desaparecem da sua frente no lixinho do banheiro... Aliás, eles permanecem entre nós por muito tempo, deixando resíduos difíceis de processar, que aumentarão os lixões e a poluição. Certas partes do nosso "modess", por exemplo, podem levar até 100 anos pra se decompor.
Isso sem falar nos componentes químicos, como os agentes que fazem o papel ficar branquinho, e que acabam escorrendo para a terra e contaminando o solo. Por exemplo, a dioxina: subproduto do processo de alvejamento com cloro, é provavelmente a substância que deveria estar mais longe das delicadas partes baixas femininas - já que foi utilizada, numa concentração mais potente, até na guerra do Vietnam. Era conhecida então pelo nome de Agente Laranja.
Outro bom motivo para adotar os absorventes reutilizáveis é a economia. Reutilizáveis podem durar até oito anos, e isso representa um bocado de reais economizados - dinheiro que iria direto para o lixo na forma de absorventes descartáveis. E então chegamos na questão da autonomia. Todos os meses, as mulheres entregam o controle de um processo poderoso e íntimo nas mãos de corporações que não têm a saúde feminina como um de seus objetivos principais. Hoje em dia, se capitaliza tudo - até a menstruação. A publicidade nos diz que é moderno e prático utilizar absorventes e tampões, e nós acreditamos. Se passamos a controlar, nós mesmas, o que fazemos do nosso ciclo mensal, abre-se uma porta para que ocorra uma mudança profunda na maneira pela qual encaramos a "incomodação".

O resgate do feminino e a conexão com o planeta

Ao invés de incômodo, a menstruação pode significar uma chance de interiorização e cultivo da feminilidade. O sangue menstrual, detestado por inúmeras mulheres e considerado sujo em muitas sociedades, pode passar a ser visto de maneira diferente. E então, talvez a idéia de lavar nossos absorventes e reutilizá-los na próxima lua não parecerá assim tão maluca. Afinal, estamos colaborando para um planeta melhor, ao mesmo tempo em que se resgatamos nosso poder feminino.
O uso de absorventes não descartáveis representa um contato mais íntimo com você mesma. "Ao invés de jogar no lixo um sinal de fertilidade, você passa a se relacionar com este sinal, percebendo que a menstruação pode ser uma coisa positiva. É sinal de que você ovulou, e que não precisa ficar preocupada, se seus hormônios estão ok ou não. É sinal de que você fechou um ciclo, assim como a lua, e que agora irá começar outro. É um sinal de esperança do seu corpo, pois é uma limpeza que ele está fazendo para no mês que vem se preparar novamente para gerar uma nova vida", lembra Diana Hirsch. "O ciclo menstrual é um grande presente em termos de flexibilidade, regeneração e criatividade. É um instrumento poderoso para se viver autenticamente, com responsabilidade e consciência", completa Nadia MacLeod, responsável pelo site australiano Menstruation. "Lavar os absorventes e reciclar o sangue no jardim, me mantendo conectada com a Terra, me ajuda a ter consciência dos ciclos da vida".
É preciso mesmo parar de olhar com repulsa, vergonha e medo para esse ciclo que acontece com todas as mulheres. Esse sentimento de sujeira, na opinião de Diana Hirsch, é resquício da sociedade patriarcal em que vivemos. Mas a humanidade nem sempre viveu no patriarcado. Há muito tempo, existiam sociedades de organização matriarcal, nas quais as mulheres eram respeitadas e veneradas e Deus não era Deus - e sim Deusa. Segundo Nadia MacLeod, na medida em que o patriarcado começou a se expandir, as culturas baseadas no culto à Grande Deusa ou à Mãe-Terra foram dizimadas ou se esconderam. "Com isso, se perdeu a reverência, conhecimento e poder inerentes ao ciclo menstrual. Lara Owen, no livro Seu Sangue é Ouro - resgatando o poder da menstruação, completa: "Nos últimos milhares de anos, todas as principais religiões do mundo tornaram-se patriarcais, e todas elas valorizam o intelecto e o espírito acima do corpo e dos instintos".
As sociedades que cultuavam a Grande Deusa viam a menstruação como um processo mágico, quando a mulher podia se conectar com os ciclos do planeta e da vida. "Durante muito tempo, até a Idade Média, vários rituais de fertilidade em adoração à Deusa eram feitos quando as mulheres da tribo estavam menstruando", diz Diana. "O sangramento periódico das mulheres era um acontecimento cósmico, como os ciclos da lua e a subida e descida das marés", afirma Elinor Gadon no livro The Once and Future Goddess. Nadia MacLeod completa: "A menstruação, que já foi considerada uma ferramenta de alto poder de cura para as mulheres e suas comunidades, agora está confinada ao banheiro".

Texto didático e brilhante de Alessandra Nahra

2 comentários:

Nana Odara disse...

Pergunta de "marciana"...
O absorvente interno, em algodão, tipo OB, tbm pode ser ecologicamente correto, ou não???

Green Womyn disse...

Nana, o absorvente interno tipo OB é a coisa mais ruim que uma mulher pode usar dentro de si! Os ecológicos sáo os coletores menstruais, como Mooncup, Divacup e The Keeper, entre outros.